domingo, 25 de agosto de 2013

                        AGENTES SECRETOS


Quem pode ter estado nos bastidores de todas as heresias, arianismo, cátaros, Templários, maçonarias, reforma protestante, Revolução Francesa, e sei lá que mais? Podem ter sido os descendentes dos reis merovíngios. Talvez ache exagero, mas enfim…
As famílias merovíngias secretas nunca teriam deixado de agitar na sombra todas as hostes contra a Igreja de Roma, despistando a História e os poderes com infinitos disfarces e variadíssimas máscaras. Os descendentes do assassinado Dagoberto II terão conspirado contra as linhas reinantes de França tanto quanto contra Roma. Uma confraria secreta teria nascido em França e continuaria, na actualidade, a estar radicada em França, embora, já se vê, com admissíveis ramificações por esse mundo fora. O seu nome remontaria aos primeiros anos do segundo milénio da era cristã. Ordem de Sião. Mais tarde Priorado de Sião.
E, estranhamente, em vez dos previsíveis homens da  aristocracia, da banca, da política, a confraria pode ter tido à cabeça, para além, claro, de alguns nobres, um bom número de artistas de primeira água, pintores, poetas, um grande compositor, um grande cientista, o que tornaria – se fosse verdade - os objectivos e o funcionamento da ordem mais intrigantes ainda.
Nomes? Botticelli, Victor Hugo, Newton, Debussy, Jean Cocteau.
E Leonardo da Vinci.
O fictício conservador do Museu do Louvre, ficticiamente assassinado no famoso romance (Código da Vinci), é sugerido como grão mestre do Priorado de Sião ao tempo dos factos do romance, o último de todos, por conseguinte, e o seu assassínio em simultâneo com o dos seus senescais, significaria a decapitação da sociedade secreta, dada a dificuldade de garantir a sucessão no cargo – que implicava segredos só do conhecimento dessas duas ou três pessoas e passados a gente indevida e indigna -, podendo inferir-se que da decapitação ficcional da sociedade o autor pretenderia comunicar a extinção prática dela, ou, pelo menos, a menor efectividade das suas influências e poderes no curso da vida das nações. Ou até que da revelação desses segredos a uma organização do Vaticano o seu conteúdo e a sua verdade seriam para sempre apagados da História. 
Leonardo terá sido cabeça secreta do Priorado de Sião entre os anos de 1510 e 1519. E o conservador assassinado, tendo Da Vinci como seu artista favorito, prestava tributo não tanto ao artista ou à obra, mas a uma linhagem de grandes senhores e de imensos e perturbantes conhecimentos, fazendo crer que grande parte dos portentosos segredos do mundo e da História se continham de forma codificada na obra de Leonardo.
O maior de todos os mistérios poderia assentar numa iconografia (ou iconologia) da deusa, o sagrado feminino, a orígem da vida, o espírito pagão, o menosprezo e a desobediência à Igreja de Roma que em contrapartida teria mistificado a História e a vida.
Está bem. E como o secreto dá para tudo e permite todas as conjecturas e falsificações, inclusive históricas, um dos grandes segredos do Priorado de Sião seria também a identidade dos seus membros, os já passados e os ainda hipoteticamente vivos.
Poder-se-ia  dizer-se que o segredo da sobrevivência do Priorado de Sião ao longo de tantos séculos, nove, estaria nele mesmo, o Segredo, e também na sua capacidade de se desmultiplicar em diversos organismos secretos, de reformular sub-objectivos dentro do objectivo primordial, de reciclar a sua actuação ao compasso do segredo dos tempos e de cada tempo. De certo modo poderia ter acompanhado nos métodos a sua inimiga, a Igreja de Roma. Uma sociedade secreta pode existir pelos séculos dos séculos conforme a habilidade de classificar inimigos e a estratégia e de se lhes adaptar, afivelando e desafivelando máscaras, envergando e despindo disfarces à medida da conveniência.


As finalidades do Priorado manifestar-se-iam de quando em quando na História de modo mais evidente – segundo dizem os que sabem… ou parecem saber. Em 1562, em pleno Concílio de Trento, é o cardeal de Lorena que propõe uma descentralização do papado, uma autonomia mais efectiva para os bispos regionais e uma restauração das hierarquias eclesiásticas -  tudo isso propostas que visavam repor a vida da Igreja nos mesmos moldes em que funcionava nos tempos merovíngios.
Parece fácil de negar que a História de nove séculos da Europa foi marcada pelo contra-poder oculto de uma monarquia sombra, de uma genealogia clandestina? Pergunto.
Sem os merovíngios, o Priorado de Sião não existiria; sem o Priorado, a dinastia merovíngia já se teria extinguido: palavras alegadamente escritas em artigo de jornal por um eventual membro da ordem secreta.
E há um rei. Só um. Desconhecido. E há os grão mestres da Ordem, seus vassalos, sujeitos à morte, e que gozaram de êxitos na vida e muitas vezes de inesperados revezes, ou até pereceram em desgraças inexplicáveis.
Há um destino. O Segredo que guardam enaltece-os e abate-os. Uma moral mágica de incenso e enxofre. Brr…


Uma das mais importantes e célebres fachadas meio legais meio clandestinas do Priorado de Sião teria sido uma organização na aparência ultra-católica, chamada Compagnie du Saint Sacrement.


O Saint Sacrement seria uma sociedade secreta implacável e eficiente na acção. A sua existência está, segundo dizem, amplamente documentada e ainda hoje, ao que leio, se fala dela em certos círculos místicos. Terá sido fundada por um indivíduo próximo de Gaston d’Orléans por volta de 1627, e só eram conhecidos os seus membros de mais baixo estatuto, por assim dizer, os visíveis, sendo que, para as operações clandestinas, os seus homens de mão eram totalmente anónimos, bem como os seus mais altos mandantes e estrategas.
Dizem que a Companhia do Saint Sacrement se organizava semelhantemente ao que tinham sido os Templários, ao mesmo tempo que se anunciava organizativamente um passo adiante, a caminho do que seria a futura organização maçónica. A sede era na Igreja de Saint Sulpice – sobre a Linha da Rosa, justamente - e os tentáculos da companhia estendiam-se por todo o território francês. Faziam um trabalho clandestino impecável de perfeição. Cada membro só conhecia um ou dois confrades. Estavam proibidos de se contactar uns aos outros. Todos os contactos eram centralizados em Paris, a partir de Saint Sulpice. Mas mesmo aí os escalões superiores estavam na mais impenetrável clandestinidade e até hoje nunca se soube quem manejava os cordelinhos.


O Segredo era o coração da Companhia: era a divisa, o essencial espírito da companhia.
Mas na sua fachada visível a Companhia do Saint Sacrement tinha por fins a assistência aos desvalidos e as obras de caridade, sobretudo nas regiões assoladas pelas guerras. Picardia, Champagne, por exemplo, e… a Lorena. Por outro lado, o objectivo central da Companhia seria recolher informações e promover a infiltração de agentes seus nos mais altos níveis do Estado e o mais próximo possível do rei.
O mais tarde chamado S. Vicente de Paulo chegaria – se foi verdade - a ser agente da Companhia e nessa qualidade conseguiria ser confessor de Luis XIII e de Luis XIV. A própria Ana de Áustria pode ter sido, consciente ou inconscientemente,  uma agente do Saint Sacrement.
Bom, mas o alvo a abater era o 1º ministro, o cardeal  Pietro Mazarino.
Ninguém, historiador que fosse, parece que conseguiu explicar convenientemente a Companhia do Saint Sacrement. Uma organização ultra-católica que tinha como membros católicos ortodoxos do mais fanático que se pudesse arranjar. Perseguiam os hereges, claro. Mas o que ninguém conseguiu explicar foi porque é que num país católico como a França, uma associação católica tão fundamentalista funcionava num tão duro secretismo. E se os hereges poderiam ser, por exemplo, os protestantes, como se explicava a presença de protestantes  nas fileiras do  Saint Sacrement?
E como explicar que uma organização tão católica não apoiasse o cardeal Mazarino, a primeira figura da Igreja francesa? Mazarino que aliás jurou um dia pelos seus santinhos usar de todos os meios para destruir a Companhia du Saint Sacrement.
E a Companhia tinha ainda activamente contra ela outro inimigo de peso, os jesuítas.
E também ela foi acusada de heresia… quando um dos seus objectivos manifestos era a perseguição aos hereges…
Mas lá calha que a fundação da Companhia do Saint Sacrement tivesse coincidido com o auge das movimentações do movimento rosa-cruz. E pode pensar-se que a melhor maneira de os rosa-cruzes prosseguirem as suas actividades era fundarem eles mesmos uma instituição que tivesse por finalidade primeira e visível persegui-los.
A coisa pode ter sido de tal monta que o Saint. Sacrement se permitiu desafiar o rei e o seu 1º ministro. Em 1660, o rei declara-se inimigo da Companhia e ordena-lhe a extinção. Mas julgam que a Companhia ligou peva à declaração régia? Não, não ligou. Durante cinco anos. Até entender, ao cabo de cinco anos, que não era aconselhável continuar naquela situação. E então tratou de recolher e fazer esconder todos os documentos que dissessem respeito ao Saint Sacrement. Esconder onde? Em lugar secreto. Em Paris, todavia. E num lugar secreto que nunca foi descoberto. Talvez em Saint Sulpice. Pensou-se que sim. Nunca se soube.
Segundo se diz, apesar de formalmente extinta a Companhia do Saint Sacrement continuou em acção. E continuou a incomodar Luis XIV. E continuou pelos tempos que se seguiram a existir. E a agir. Dizem que sobreviveu até ao século XX. Se calhar até hoje.
Por curiosidade, podemos falar de algumas celebridades mundiais que estavam contra a companhia e de outras que estavam a favor dela e que trabalharam mesmo a soldo dela. Moliére. Era contra. Era um adversário da Companhia. A peça Tartufo é um libelo velado e codificado contra a Companhia. A Companhia sabia disso e não se ficou. E conseguiu ter artes de suspender a estreia da peça por nem menos de dois anos, e ainda que Moliére fosse um protegido do rei.
Já La Rochefoucauld terá sido um homem da Companhia, aliás já interventor nos tempos da Fronda. E La Fontaine, o das fábulas, outro que tal, homem do Saint Sacrement. As fábulas dele, aparentemente inocentes e infantis, eram requisitórios cifrados contra o rei – rei que, de resto,  odiava La Fontaine ao ponto de vetar o nome dele para a Académie Française. Valeram a La Fontaine outros apoios e protecções, o Duque de Guise, o Duque de Bouillon, os do Segredo.
Pois é. É assim a vida. E é assim que se calhar se faz a História, até nas vidas artísticas e literárias.
E qual de nós ainda tem a ingenuidade de pensar que hoje as coisas na política e nos assuntos de Estado se passam de maneira diferente?
Sim, claro, hoje, ainda, why not, apesar da mesquinhez dos tempos e dos ideais, apesar dos computadores e das tecnologias e dos Snowden’s e dos sofisticados microfones e aparelhos de escuta… oh, o que a Companhia do Saint Sacrement não se teria divertido e pintado a manta com a tecnologia que há hoje! 
Mas será que anda hoje não se diverte e não pinta a manta, a chamar-se Saint Sacrement ou a chamar-se outra coisa qualquer? Ou a não se chamar coisíssima nenhuma…

                            

Em 1614, na Alemanha e na Inglaterra, aparecem os primeiros manifestos Rosa-Cruz. A Europa protestante e liberal aplaudiu. A Igreja condenou furiosamente. Um rosa-cruz notório, Robert Fludd, torna-se grão mestre do Priorado entre 1595 e 1637.
Os manifestos Rosa-Cruz anunciavam uma transformação do mundo e do conhecimento dinamizados por uma irmandade iniciática internacional, secreta, invisível. A presidir à transformação do mundo estariam princípios herméticos, uma corrente subterrânea que arrancara da acção de René d’Anjou e atravessara todo o Renascimento europeu. Liberdade espiritual: a palavra de ordem; libertação do Homem; revelação de segredos da natureza; regresso à harmonia da terra e do cosmos. O autor dos manifestos rosa-cruz talvez tenha sido Johann Valentin Andrea, grão mestre de Sião entre 1637 e 1654.
As Bodas Químicas de Christian Rosenkreutz, talvez o mais divulgado dos textos rosacrucianos, surge à luz do dia em 1616, de autoria anónima. Cria-se que tenha tido influência sobre a intelectualidade alemã, sobre Goethe e o seu Fausto, por exemplo.
O Caso de Joana D’Arc parece ter levado mãozinha do Priorado.
Terá sido René d’ Anjou o agente do Priorado na questão de Joana D’Arc. Talvez ele e Joana tivessem mesmo sido amantes – diz-me o coração que não, mas eu sei lá. O duque de Lorena, tio-avô de René d’Anjou ficou de cara à banda quando perguntou à rapariga o que desejava e ela lhe respondeu serenamente: O seu filho (René), um cavalo e alguns bons homens para me levarem para França.


É histórico. René d’Anjou acompanhou de facto Joana d’Arc até à corte do Delfim. Esteve junto dela no cerco de Orléans. Os historiadores iriam querer subtraí-los destas cavalarias, mas a dúvida sobre o que terá feito René d’Anjou entre 1429 e 1431 permaneceu.


E quem esteve a tratar da saúde do Delfim em Chinon? Yolande d’Anjou, mãe de René, que se declarou protectora de Joana d’Arc. E quem convenceu o Delfim de que a rapariga poderia mesmo ser a salvadora da França? Yolande d’Anjou.
      Leio que os historiadores mais modernos admitem que alguma força oculta teria estado por detrás dos factos visíveis, que Joana d’Arc não aparecera por acaso e não fora aceite por capricho, e que Joana até se quadrava muito bem com a lenda da virgem de Lorena. E também porque… René d’ Anjou teria sido grão mestre do Priorado de Sião entre 1480 e 1483.
Mas também se disse que Joana d’Arc  entrou no salão do castelo de Chinon e que Carlos VII  imediatamente tratou de se dissimular entre os cortesãos, transido de medo. Diante da rapariga, o rei perdia moralmente as suas dignidades, revertia às suas insignificâncias de cortesão. Mas porquê, senhores? Porque Joana d’Arc era uma embaixatriz do único e verdadeiro rei que a Europa teve – ou teria… ou terá tido. Joana aproximara-se de Carlos VII para lhe dizer uma coisa, anda cá Carlinhos, anda cá, filho, não fujas, meu malandrão. E que lhe diz ela em segredo? Diz-lhe: Gentil Senhor, venho em nome do rei. Dizer isto ao rei era desaforo de marca, não? O rei autêntico da Europa, o do sangue, o do Segredo, o da linhagem, era um rei perdido, era o último elo da dinastia merovíngia oculta. E continuava a governar. Na sombra. Inquietante, não é? E os reis visíveis sabiam-lhe da existência, sabiam e sabem quem ele é, temem-no. Ele é rei porque sim, só por si, só por ser quem é, o único rei da mais legítima linhagem. E quem quer que fale ou comande em nome do Priorado de Sião, fala e comanda em nome do rei, do rei perdido. E só o rei perdido verdadeiramente interessa ao Priorado. Todos os outros podem morrer, ser destronados, acabar-se-lhes com a raça. Só a linhagem do sangue deve subsistir seja em que circunstâncias for.
Se non è vero è bene trovato.
O objectivo capital do Priorado ainda no século XVI era restaurar a monarquia francesa elevando ao trono um descendente dos merovíngios – o que queria dizer igualmente um descendente de Jesus Cristo -  um dos da Casa de Lorena ou da casa de Guise. Um dos do Segredo. Em 1563, a coisa está por um triz. François de Guise tem praticamente o trono nas mãos no dia em que é assassinado.
O Priorado trabalhava sob o emblema da cruz de Lorena e dispunha de uma rede clandestina de se lhe tirar o chapéu em emissários, agentes secretos, espiões, embaixadores, agentes provocadores e assassinos a soldo. 
Nostradamus pode ter sido um desses agentes clandestinos do Priorado, e um dos mais importantes, o verdadeiro 007, ao serviço dos Guise e do cardeal de Lorena. Nostradamus, astrólogo da corte ao serviço dos Valois reinantes, era o agente secreto ideal desses tempos e desses lugares, uma autêntica ponta de lança infiltrada no coração do inimigo, conhecedor de segredos e capaz de influenciar umas poucas de decisões do rei. Nostradamus era o homem com melhores condições para definir o momento mais oportuno para um passo a dar, uma palavra, um boato, um assassínio, e as suas famosas profecias seriam mensagens cifradas com indicação de horários, hábitos e planos de acção.
Muitas das profecias de Nostradamus remetiam ao passado, aos tempos merovíngios, ao historial da casa de Lorena. Além do mais, antes de se afirmar na arte da profecia, Nostradamus viveu muito tempo nos domínios dos Lorena e aí terá cumprido a sua iniciação e ficado guardador do formidável segredo contido num antiquíssimo livro mantido ultra secreto.
Outro. Nicolas Fouquet. Era superintendente de Finanças de Luís XIV. Tinha um irmão que vivia em Roma e era padre. O irmão visitara o pintor Poussin (também ele a viver em Roma) e depois da visita escrevera uma carta a Nicolas, o tal superintendente de Finanças de Luis XIV. Nessa carta se falava em coisas que mesmo os reis invejariam e teriam dificuldade em obter. Pois logo após ter recebido a carta do irmão, Nicolas Fouquet, a despeito do seu altíssimo cargo, é preso. Nicolas Fouquet, superintendente de Finanças do Rei-Sol é preso e preso fica o resto da vida, e mais do que preso, absolutamente incomunicável. Há rumores de que possa ter sido ele o misterioso Prisioneiro da Máscara de Ferro.
Quanto ao rei, confiscou e inspeccionou toda a correspondência do seu ex-superintendente de Finanças. Além disso, mandou emissários seus correrem seca e meca de modo a obter o original do quadro de Poussin, Les Bergéres d’Arcadie. Obteve-o. O quadro ficou guardado nos aposentos privados do rei.
Ui, senhores, as maravilhosas histórias que o mundo tem guardadas para um dia serem contadas! - verdadeiras ou inventadas, não importa agora para o caso…


Caberia na cabeça de alguém que o arqui-célebre cardeal Richelieu, 1ºministro de França, principal hierarca da Igreja francesa, fosse secretamente um rosa-cruz? Não. Não cabia.
    Mas rebenta a Guerra dos Trinta Anos. De um lado está o catolicismo, a Espanha, a Áustria; do outro combatem os suecos protestantes mais os príncipes alemães, apoiados esses pelos movimentos rosacrucianos. Em 1633, Richelieu resolve envolver a França na Guerra dos Trinta Anos. Previsivelmente tê-lo-ía feito pugnando pelo lado católico. Mas não. Richelieu teve em conta os interesses do Estado. A Espanha e a Áustria incomodavam-no, ameaçavam-lhe as fronteiras.
Mas não era só isso. A Espanha dominava então aquela parte da Europa que era território histórico dos merovíngios, os Países Baixos, a Flandres, parte da Lorena. E Richelieu, ultrapassando os puros interesses do Estado, e colocando os exércitos do seu rei ao serviço do Segredo e na defesa dos interesses de uma minoria secreta, fez avançar a França católica ao lado dos protestantes contra os católicos, directa ou indirectamente (mas sobretudo  ideologicamente) apoiado pelo movimento rosacruciano.
Disse-se de Richelieu que era o pai secreto do filho  tardio de Ana de Áustria, em 1638 – lá teremos de voltar a ler os Três Mosqueteiros.
Mas também se disse que o filho da rainha não seria de Richelieu mas do seu (dele, Richelieu) protegido e futuro 1º ministro, o cardeal italiano Pietro Mazarino.
Em qualquer dos casos, nascera um herdeiro de Luis XIII e isso foi um golpe doloroso nas aspirações da casa de Lorena e nos interesses do Priorado. Priorado que nas épocas subsequentes elegeria o cardeal Mazarino como inimigo principal.
O movimento conhecido como a Fronda foi uma iniciativa do Priorado para restaurar a nova monarquia. Falhou. Luis XIV subiu ao trono e Mazarino foi seu 1ºministro.
Maria Antonieta, raínha de França, era filha do duque de Lorena. Os Habsburgo-Lorena estavam a uma geração de reinar sobre a Europa. Mais uma geração e seriam os merovíngios, finalmente, a aceder de novo ao poder. Isso queria dizer que a revelação dos tesouros templários estava perto. Pois é. Estaria perto se não tivesse havido a Revolução Francesa.
Mas também ninguém me garante que a Revolução Francesa não aconteceu no preciso momento histórico em que aconteceu justamente para impedir tal desiderato.


Sabe-se entretanto, ou julga saber-se, que entre 1789 e 1792 se fizeram depósitos clandestinos com vista a preservar das mãos do Terror certos documentos preciosos. Parte desses documentos sobreviveram. Essa parte foi confiada a um Lorena. Passou depois para as mãos dos Habsburgos. Até que, muitas décadas depois, os Habsburgos se põem em contacto com  um certo padre Sauniére, de Rennes-Le-Château. Porquê e para quê?


Ainda na onda da Revolução Francesa, saiba-se que o poeta André Chénier esteve metido no caso dos documentos escondidos. Chénier parece que falava de uns certos documentos do Templo. Que Templo? A Ordem do Templo? Não me admirava que André Chénier tivesse sido executado mais por causa deste caldinho do  que por qualquer outra coisa.
Mas nesta época o Priorado terá deixado extraviar alguns dos seus mais preciosos documentos. É desde então que a sucessão dos grão mestres do Priorado deixa de seguir uma linha mais ou menos familiar e estes passam a ser escolhidos entre figuras da cultura francesa.
E por falar em coisas secretas, ocultismos, magías e esoterismos, verdades e mentiras  tão em moda, e do seu papel na História verdadeira da vida do Homem, chegaria dizer da relevância magna que, no século XVIII e seguintes, para o melhor e talvez para o menos bom, teve a Maçonaria na História europeia, e a vários carrinhos, na cultura, no social, na política, claro – já não falando nem na Revolução Francesa, nem na fundação (quase diria da invenção) de um continente, o americano. A fundação das américas é um acto maçónico. E incluída nas américas a fundação do país mais poderoso, os Estados Unidos. Mas será que a historiografia oficial se ocupou da Maçonaria, pelo menos com relevo correspondente ao papel dela na História?


E que tal o papel dos famosos e misteriosos rosa-cruzes em tanto facto histórico? A Guerra dos Trinta Anos, por exemplo. E o papel do esoterismo nos meandros do que ficou historicamente consagrado como o Renascimento? Pouco ou nada se falou disso. Talvez se comece agora a falar. E talvez esse falar seja parte da revelação do Segredo, do Graal. E talvez resida aí o principal interesse do romance de Dan Brown O Código da Vinci.


Nada existe mais do que aquilo que não existe.
Os códigos da Vinci que se escreveram, se estão a escrever e se continuarão a escrever no futuro talvez não façam todavia mais do que aflorar a superfície mais epidérmica do que realmente existe e acontece, existiu e aconteceu, existirá e acontecerá. Ou não? Ou apenas são mais um truque para melhor esconder a verdade? Isso depende da fézada de cada um.
Nada existe mais do que aquilo que não existe.
E já agora, recalcitrando em estulta citação do bardo de Stratford,  há mais coisas, Horácio,  entre o céu e a terra do que sonha a tua vã filosofia. Mais ou menos isto. Mas todas estas frases shakespearianas só atestam o quanto ele, Shakespeare, devia estar por dentro de um segredo. Um segredo que talvez fosse O segredo.






1 comentário:

  1. Por detrás de toda esta tenebrosa "trapalhada", podemos ver os arquétipos da nossa sociedade actual:
    O Santo Graal: o lucro, o dinheiro
    Os mestres invisíveis: as multinacionais com a sua estrutura anónima e tentacular.
    Os executores visíveis: presidentes, directores, políticos, economistas, todos os "esclarecidos" e afins

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