domingo, 24 de março de 2013



A NOVA ORDEM GLOBAL DO  

                        ÓPIO

 

Sabendo o que sabemos da presente conjuntura do mundo e da vida, ou, enfim, do dinheiro e suas aventuras, não percebo toda a espanto-indignação ao sabermos que a troika quer ir às economias dos pobres cipriotas. O capital é danado de ganacioso. E de invejoso de alguma camisita lavada de um pobre…

 

Vamo-nos deixar de histórias da carochinha quanto às maravilhas inebriantes da globalização e deste mundo novo, minhas senhoras e meus senhores. As maravilhas da globalização são maravilhosas, e propagandeadas como maravilhosas, pela liberalidade e impunidade que os estados garantem às várias redes do crime a operar globalmente.

        O Monde Diplomatique, no ano 2000, escrevia: ao permitir que o capital flua sem controlo de um extremo a outro do mundo, a globalização e o abandono da soberania juntaram-se para promover o crescimento explosivo de um mercado financeiro fora da lei. É um sistema coeso, intimamente ligado à expansão do capitalismo moderno e baseado na associação de três parceiros: governos, multinacionais e máfias.

Pois é, a nova ordem está aí a rebentar – ou já aí está. E pelo andar dessa carruagem nada garante que essa nova ordem seja melhor para o cidadão comum do que a velha. Porque há jornalistas internacionais que se dedicam à investigação, que descobrem coisas escondidas que nunca são desmentidas, que publicam livros com  os resultados dessas investigações e que nos põem a alma e a cidadania num inferno.

A guerra do Kosovo existiu, ou teve como causa, diferendos relativos ao tráfico de droga. Onde é que cabe na cabeça de alguém que uma guerra e os consequentes morticínios e genocídios possa acontecer em razão de um fenómeno que para nós, cidadãos portugueses despreocupados (e menos, e pior informados, tenho a certeza disso, do que quaisquer outros) entendemos como próprio de marginais inclassificáveis, e só com importância real quando temos filhos adolescentes, quer dizer, uma importância situada, reduzida ao nosso pequeno mundo pessoal e familiar… sim, onde é que cabe na cabeça de alguém que o que move os drogados do Casal Ventoso ou da Curraleira, possa dar lugar a uma guerra de contornos europeus - ou, quem sabe, um dia, mundial.

                                                                                                 

É que, com os lucros do tráfico de droga, vêm por acréscimo os lucros do contrabando de armas. Uma coisa está intimamente ligada à outra. E se uma coisa se liga com a outra, para haver lucro no contrabando de armas tem que haver guerras, e para haver guerras, pensavamos nós, teriam de se reunir poderosas razões de alta política e haver lesão de interesses dos povos. Mas parece que não. Parece que as razões da alta politica e do interesse dos povos são invocadas como biombo para as verdadeiras razões de uma guerra moderna, e que serão, ou poderão ser, afinal de contas, os interesses dos poderosos grupos económicos privados.
Na guerra do Kosovo, pelo que tomo conhecimento no livro acabadinho de ler do conhecido jornalista internacional Daniel Estulin,  Os Senhores da Sombra (editado pela Europa-América), um papel determinante caberia a Albânia, país dominado por grupos organizados do crime, que lá cultivam, processam e armazenam uma enorme percentagem das drogas a comercializar na Europa ocidental. Seria o lucro desse negócio a financiar os rebeldes do Kosovo.    
                                                       
                                             

Lê-se no livro de Daniel Estulin (há quem diga que trabalha para os serviços secretos russos, não sei): pondo de lado os contos de fadas populares, a guerra do Vietnam foi sobre drogas. Os franceses foram expulsos e o consequente vazio foi imediatamente preenchido pela CIA, que assumiu o comércio da droga, o processamento e a distribuição. Nesta simples perspectiva pouco fica para visões idealistas da guerra do Vietnam como o conflito entre o Bem e o Mal, a Velha Glória contra a Foice e o Martelo, etc.


Talvez seja exagero. Digo eu. Mas diz ele ainda que as forças armadas são alimentadas, e bem, a dinheiro. Compete-lhes assegurar os recursos e manter operacionais os mercados. Guerra e drogas podem formar um par indivisível.


Pois, o Afeganistão. A ideia mestra, no dizer de alguns jornalistas internacionais, é uma ocupação para proteger a zona mais lucrativa de tráfico de drogas deste mundo.


     E se me dissessem que a principal actividade da CIA está relacionada com os negócios da droga eu não acreditava. Mas quando leio a transcrição da exposição que um tal senhor Michael Ruppert enviou ao congresso dos EUA fico na dúvida.


Fui detective de narcóticos na polícia de Los Angeles e posso garantir sem dúvida alguma, e com provas, que a agência (CIA) trafica drogas neste país há muito tempo.

A CIA traficou drogas durante a época do famoso caso Irão-Contras? Sim. Segundo um escrito do personagem principal do caso, o coronel Oliver North, de Julho de 1985, 14 milhões de dólares para adquirir armas para os contras da Nicarágua tinham vindo do negócio das drogas.
                                                            Ou mais: ao longo dos 50 anos da sua existência, a CIA não deixou de traficar drogas. Designadamente, como já se disse,  nos tempos da guerra do Vietnam.
A CIA seria responsável pelos principais movimentos da droga por esse mundo, tanto quanto pelas operações de branqueamento dos lucros. De cada vez que a CIA entra em acção num cenário critico por esse mundo de Deus acontece uma explosão de heroína na região.


Se o Iraque nunca foi uma entidade de primeira plana nos assuntos da droga, é hoje uma zona fulcral de escoamento da heroína afegã – diz o Conselho Internacional para o Controlo dos Narcóticos.
Ingenuamente, perguntaram a John Gotti Jor., um dos grandes patrões da Mafia americana, se afinal negociava ou não com narcóticos, ao que ele replicou: não, de maneira nenhuma, ninguém consegue nesse ramo fazer concorrência ao governo.
Num relatório de um Inspector Geral da CIA, pode ler-se que o governo do EUA teria facilitado o tráfico de drogas. A CIA e o Departamento de Justiça produziram um memorando permitindo à CIA ajudar os aliados dos EUA a traficarem drogas sem dar satisfações – e, suponho eu, com vista ao seu auto-financiamento.
Coitada também da CIA… como se dos serviços secretos desse mundo fosse só ela a ter as culpas todas do cartório. E o MI 6 inglês? E a Mossad israelita? E a DGSE francesa? E o FSB russo?


O Monde Diplomatique fala dos serviços de informação dos EUA, de bancos, e multinacionais como actores na rede global de lavagem de dinheiro.

   

Cartéis, especulação com informações, balanços fraudulentos, subtracção de fundos públicos, espionagem, chantagens – é este o mundo global, a nova ordem, que nos passa debaixo do nariz, a nós, cidadãos normais tapadinhos de todo; um mundo global (e ainda por cima, ou por isso mesmo, em severíssima crise financeira) de que os televisões e os jornais não falam, ou falam muito pouco, e pela rama, e de modo um tanto selectivo – presumivelmente estão orientados para isso…
Nenhuma das actividades fraudulentas e imorais de que falei poderiam existir, e acontecer, sem os governos fecharem piedosamente os olhos.


Um mundo e uma globalização subterraneamente governados por gangsters o sistema em que vivemos? Não vejo onde está a dúvida. Basta mesmo olhar para o que se tem passado à nossa escala pequena e pelintra.


                                                               

O lucro global gerado pelo tráfico de drogas pode ascender aos 700.000 milhões de dólares/ano, incluindo ópio, heroína, cocaína, marijuana, morfina, crack e outros. Demasiado dinheiro para ficar debaixo do colchão. Demasiado dinheiro para não interferir nos circuitos mundiais do dinheiro e no mercado dos capitais.
Demasiado dinheiro para não constituir componente essencial do sistema financeiro à escala global, pela liquidez rápida que proporciona e que se canaliza para as diversas bolhas financeiras, em acções e investimentos.
A questão seria saber como é que 700.000 milhões de dólares podem circular no sistema bancário internacional passando ao lado da vigilância das autoridades nacionais, as mesmas que não nos perdoam um cêntimo de IRS.
Já houve tempos em que não, mas hoje em dia negociar com estupefacientes é ilícito, e os lucros do negócio são ilegais. Ora antes que o dinheiro desses lucros possa ser usado legalmente ele tem que desaparecer, ser escondido, e depois legalizado, que o mesmo é dizer reciclado em operações financeiras legais.

Por exemplo, uma empresa pode pedir de empréstimo a um barão da droga uma enorme quantia a uma taxa de juro inferior, desde que se comprometa a branquear esse dinheiro sujo, ganhando com isso milhões. 100 mil milhões de dólares ilegais, portanto inúteis, emprestados a 5% a uma grande multinacional, transformam-se em dinheiro legal, limpo, e em cash.
Relatório do FMI de 2001 – A produção e branqueamento do dinheiro da droga é fundamental, porque estabelece canais para o fluxo de outros lucros provenientes do crime.
Segundo o Foreign Office, a lavagem de dinheiro processa 1,5 biliões de dólares, o que representa entre 2 e 5% do PIB global – quer dizer, superior ao PIB de todas as economias do mundo, deixando de fora as cinco maiores.


Para quem não saiba, o ópio cultiva-se aqui e ali pelo mundo. Na América da Sul, no Laos; na Birmânia, na Tailândia; no Afeganistão, no Paquistão, na Ásia Central. Os campos de papoilas florescem numa faixa de 7.250 km de montanhas desde o sul da Ásia, desde a Turquia, passando pelo Paquistão. E o ópio é tratado por tribos das montanhas.
Para quem não saiba, a  planta dá uma flor, sim, a papoila, justamente, e depois, uma semana depois, as pétalas da flor caem, e fica uma vagem que segrega a goma de onde se extrai o ópio bruto. A goma do ópio é mandada para a refinaria e na refinaria se transforma, por processos químicos, em morfina e heroína.

Os cultivadores das tribos da montanha  são pagos em barras de ouro de um quilo cada, cunhadas pelo Crédit Suisse. Mas as barras de ouro de peso normal são comercializadas em Hong Kong pelos grandes comerciantes de ópio bruto, ou da resultante heroína, já processada por metade.
O ópio em bruto vem pela Turquia, chega, por exemplo, à Córsega, e processa-se e transforma-se na Europa. Mas no Médio Oriente há espaços muito lucrativos de refinação de heroína. Na Europa, as refinarias são referenciadas ali para o sul de França, entre Marselha e Monte Carlo, e dizem até as más línguas, não se sabe se com verdade, que a própria família dominante do Mónaco pode estar envolvida no ramo - aliás, segundo leio, o Mónaco é o centro mundial por excelência no processamento do ópio – o que dificilmente seria possível sem o conhecimento dos Grimaldi. 

                                                                

E para não fugir ao âmbito das teorias de conspiração, infelizmente muitas delas com boas pernas para andar, consta em certos meios que a princesa Grace não foi vítima de desastre nenhum, foi mas foi assassinada, e porque o marido, o príncipe Rainier, crendo-se intocável por aquela malandragem do ópio, se tornara demasiado ganancioso no que respeitava aos lucros da indústria clandestina. Foi a mulher que pagou aquelas favas. E um indício bem robusto disso é o caso de o automóvel onde ela seguia, um Rover, continuar a estar sob custódia da polícia francesa.


Ainda no capítulo da conspiração fala-se da destruição global da procura. 
Para destruir uma economia destrói-se a procura – nós, portugueses, ainda nos vamos torna catedráticos nessa matéria. 
E promove-se uma transferência de riqueza. Alguns perdem as casas, as acções, o dinheiro das poupanças, mas atrás desses virão outros que comprarão tudo por meia dúzia de patacos.

A questão do uso de drogas como garantia de vantagens económicas pode remontar aos negócios da companhia inglesa das Índias Orientais, através do contrabando de ópio da Índia para a China. E estou a falar de fins do século XVII em diante, e  pelos seus bons 300 anos, com milhares de milhões de lucros para as elites inglesas.

                        

No século XX, os negócios com drogas foram declarados ilegais. Significa isso que os proventos desse negócio, para serem efectivos, teriam de ser reintegrados na circulação legal dos dinheiros. Teriam portanto de ser, como hoje se diz, branqueados, lavados. Era bagatela que podia montar aos 700.000 milhões de dólares/ano.
Aliás, olha-se para a História e constata-se a ascensão do Ocidente entre 1500 e 1900. No centro dessa ascensão, de uma maneira ou de outra, é perceptível o rasto do comércio da droga, e sendo o ópio a primeira das drogas viciantes a desempenhar o papel principal.
Os europeus produziram e forneceram ópio às populações que pretendiam subjugar. Até começar a render lucros que beneficiavam antes de mais as instituições que favoreciam o negócio, companhias inglesa e holandesa das ìndias, o governo colonial britânico da India.
Império britânico, negócios do ópio e ascensão do capitalismo foram desenvolvidos a par e passo. E o decaír do império britânico acompanha a queda do comércio do ópio. Esquisito, não é?
Talvez nem tivesse havido império britânico sem o ópio. Os lucros do ópio e respectiva exportação pagavam todos os débitos e proporcionavam abundantes rendimentos.


É que, para os ingleses, o negócio do ópio não era uma questão de moral. Sim, questão de moral seria ganhar mais ou menos dinheiro num negócio. O ópio para os ingleses do séculos XVII e XVIII era também um instrumento da política nacional; era o suporte das finanças públicas. O comércio do ópio era louvado pelas grandes cabeças economistas liberais, Adam Smith, Stuart Mill, Thomas Malthus.

        

           O mundo podia envenenar-se de ópio, mas o império de Sua Majestade com ele fabricava nobres e estadistas de grande lustro.

Hoje, os milhões da droga circulam imaculadamente pela economia mundial e ajudam decisivamente os mercados financeiros de Wall Street. Não há razão discernível para abolir o comércio das drogas. E quanto mais ilegal melhor.
Mas como é possível que grandes e respeitabilíssimas instituições bancárias de relêvo planetário participem nos negócios da droga?
No seu livro, Daniel Estulin esboça, esboça, apenas, acho eu, um princípio de explicação, que reside no financiar aquisições legítimas de empresas registadas e licenciadas para actuarem como importadoras de produtos químicos. Caso do Hong Kong & Shanghai Bank através de uma empresa esquisitamente chamada de Tejapaibal.
 A empresa Tejapaibal importa para Hong Kong os produtos químicos precisos para processar o ópio bruto e transformá-lo em heroína através de várias manipulações e sem dispensar o anidrido acéptico – que por acaso também serve para fazer película de fotografia e cinema e aspirinas. E lá calha que os mais importantes mercados mundiais de anidrido acéptico estejam no Afeganistão. Será que no Afeganistão as correntes de ar são fortes e eles se constipam muito?

         
Outra instituição é o Bank of Nova Scotia, de Toronto, Canadá. Negociantes de ouro e líderes do mercado do ouro em Toronto, e banco preferencial das empresas mineiras canadianas e trabalhar em países do dito Terceiro Mundo.  
Vamos lá a pôr os pezinhos na terra: negócio é negócio; aqui não há moral, a não ser a do lucro máximo; o crime financeiro é um mercado florescente, e muito bem organizado, que tem a oferta e a procura como base ideológico-moral de sustentação.
Bom, a cumplicidade entre os grandes negócios e o liberalismo político-económico do laissez faire governamental concorrem decisivamente para o crime em larga escala do branqueamento e reciclagem de lucros fabulosos e ilícitos.
As grandes multinacionais precisam do apoio dos governos, precisam como pão para a boca da neutralidade das instâncias reguladoras. De contrário, não se aumentam os lucros – e os lucros, diversamente dos salários, têm de aumentar constantemente. De contrário, não se consolidam posições de mercado; não se resiste à concorrência e não se esmaga essa concorrência. Se os políticos se fingem de mortos por alguma razão é: é porque sem o apoio e os financiamentos das multinacionais não se mantinham no poder. É nesta aliança de interesses que se baseia a nova ordem, o maravilhoso mundo novo,  e que assentam as bases do capitalismo moderno. 
Empresas e instituições como o Hong Kong & Shanghai Bank, o Bank Of Nova Scotia, o Royal Bank of Scotland, o Chase Manhattan Bank, o Citybank, a General Electric podem obter 40 milhões de lucros adicionais que provenham do negócio da droga, o que multiplicaria por 20 o lucro das empresas, gerando um aumento líquido do valor da empresa na ordem dos 800 milhões de dólares.
Em fins de Junho de 99, a Associated Press informava que Richard Grasso, presidente da Bolsa de Nova York, viajava para a Colômbia a fim de se encontrar, na selva, com um representante de Raul Reyes, chefe das FARC, e principal agente narco-terrorista colombiano. Qual o objectivo da estranha viagem do presidente da Bolsa de Nova York à selva colombiana? Transmitir uma mensagem de cooperação e discutir o investimento estrangeiro e o papel das empresas americanas na Colômbia.  E que tem a Colômbia que interesse aos americanos? 

Ora… dinheiro. E que dinheiro? Dinheiro da droga. Para cima de um bilião de dólares acumulados. Wall Street baba-se de ganância sempre que pensa poder canalizar aquele dinheiro através dos seus respeitáveis mercados financeiros.
As mais poderosas empresas do mundo podem ter beneficiado – indirectamente? – dos lucros da droga. E é assustador ler que o terrorismo internacional e os mercados financeiros teriam por último escopo assegurar a permanência do capitalismo à escala global. Coitado dele, capitalismo, tão vilipendiado que tem sido, e que tão desesperado deve andar ao verificar que a sua lógica de funcionamento é desmascarada a cada um dos dias actuais e posta em causa como primeira responsável pelas dramáticas condições mundiais. E também pode ser assustador saber o quanto os negócios da droga contribuem para a subsistência desse sistema capitalista.

Deve ser a última calúnia que se inventa contra o pobre desgraçado do sistema capitalista, tão incompreendido, e tão vítima da ingratidão dos negativistas. E até nem estou a ser por demais irónico. Quanto do nosso bem-estar material se deve ao facto de vivermos em sistema capitalista? Quanto da prosperidade de tantas famílias se deve ao capitalismo? Quantas fortunas vertiginosas são devidas ao sistema capitalista?
Pois não, não passa pela cabeça de ninguém viver noutro sistema de vida. Socialismo? Comunismo? Não se sabe ao certo. E o que se sabe, pelo que se sabe, não encorajou ninguém, e até provocou uma crise ideológico-moral que deixou campo aberto justamente ao capitalismo, e na sua forma mais agressiva.

Viver em capitalismo sob controlo e regulação reais de uma entidade moral superior, o Estado, é uma coisa. Viver em capitalismo quando o Estado se torna demasiado cúmplice e se demite, e demitindo-se permite a lei da selva na vida quotidiana do cidadão comum, é outra. E a diferença entre as duas é como do dia para a noite.
Leio que do século XV ao século XX todo o funcionamento das nações, dos estados, foi assegurado pelo comércio dos estupefacientes, do ópio, em concreto. Directamente ou indirectamente. Tanto faz. E se por milénios o ópio serviu fins medicinais, a certa altura da História descobre-se que a substância cria dependências. É quando começa a dar lucros.
Ironias desta vida.
Fala-se hoje dos narco-estados, a Colômbia, o Afeganistão. Segundo o livro de que me sirvo, o primeiro de todos os narco-estados da História tinha a capital em Londres.
Toda essa história das campanhas contra a droga sempre me cheirou a esturro e hipocrisia, sempre de deu a sensação de que alguém andava a enganar alguém. Cheirou-me como cheirou a qualquer pessoa que tivesse reflectido ligeiramente sobre o assunto. Se os governos, as polícias, os exércitos quisessem acabar mesmo com a droga há quanto tempo não o teriam feito?


Mas como é que se pode acabar com um negócio que proporciona lucros das mil e uma noites?
                                               
                                                                       
                                                                           
Ninguém vai acabar com a droga enquanto ela der as fabulosas e rápidas fortunas que dá a ganhar a tanta gente por todo o mundo. É uma questão de moral. Uma certa e específica moral. A  moral que passou, pelos que vemos e ouvimos todos os dias, a reger o mundo em que vivemos,
E para os governos acabarem com a droga competir-lhes-ia promulgar leis que obrigassem os fabricantes de uma coisa que se chama anidrido aséptico – produto indispensável ao fabrico de heroína – a manter registos rigorosos, por forma a saber-se quem compra o produto, para quê, para quem e para onde. Claro que, havendo tanta gente poderosa a lucrar com o negócio, esse governo não teria longa vida. 
Ai do 1º ministro de um governo que tomasse tais medidas legislativas. Seria assassinado no dia seguinte.



1 comentário:


  1. Incrível!


    Um pouco como a fantasiosa história do comércio português das "especiarias", durante o período dito dos Descobrimentos...


    Já agora, que música sugere para servir com este instrutivo texto?

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